quarta-feira, 30 de abril de 2008

Como a Resolução do TSE ataca as liberdades democráticas na Internet

Resolução nº 22.718, do Tribunal Superior Eleitoral

Li toda a resolução do TSE e encontrei os problemas que listo abaixo.

Para ter acesso à resolução acesse http://www.tse.gov.br/downloads/eleicoes2008/r22718.pdf

Problemas Gerais

  • O principal problema da Resolução 22.718 é tratar a comunicação mediada por computador, com foco na Internet, da mesma forma que a legislação brasileira trata os meios de comunicação eletrônicos tradicionais como televisão e rádio;
  • Os meios de comunicação eletrônicos tradicionais baseiam-se na lógica emissor-receptor. As emissoras dominam os meios de produção de conteúdo e os canais para transmiti-los. Os canais de transmissão são escassos, necessitando a distribuição por concessão pública.
  • Com a Internet, a lógica é a interatividade entre seus usuários e o conteúdo é produzido de forma colaborativa. Não há escassez de acesso às ferramentas de produção desses conteúdos, já que a maioria são serviços disponibilizados gratuitamente por empresas e comunidades virtuais, que muitas vezes não estão fisicamente no Brasil. As trocas de informações na Internet são mais comparáveis a uma reunião de indivíduos, garantida pela Constituição Federal, do que uma relação entre empresa de comunicação e telespectador.
  • O uso livre e democrático da Internet está em discussão em todo o mundo. As novas tecnologias devem ser utilizadas para promover o debate eleitoral e não devemos permitir que o Brasil volte a exercer a censura. O objetivo desse texto é analisar a Resolução nº 22.718 e mostrar os pontos que consideramos inadequados ou mesmo impraticáveis.
  • É necessário diferenciar quando se trata de Internet:
    • A comunicação oficial dos candidatos e partidos - caracterizados por websites e e-mails devidamente vinculados a um CNPJ. Podem ser encarados como veículos de comunicação oficiais e seguir as regras dos meios tradicionais;
    • A livre manifestação de pensamento dos internautas - caracterizada pela troca de mensagens entre eleitores e ferramentas colaborativas como blogs, redes de relacionamento (como o orkut e myspace), e outros. Não há paralelo nos meios convencionais.
  • O candidato deve responder pelo que foi produzido por ele e sua equipe, e não por mensagem anônimas ou não, veículadas na rede.

Problemas específicos

  • Capítulo I - Art. 2º

Ao delegar ao juiz eleitoral da comarca todas as providências relacionadas à propaganda eleitoral na Internet, o TSE permitirá que casos iguais sejam julgados de maneira diferente. Pelas mesmas ações, alguns candidatos correm o risco de serem seriamente punidos enquanto outros nem terão o fato apreciado.

A sociedade teme que em grandes centros, como São Paulo e Rio de Janeiro, uma violação da Resolução não resulte em nada, já que cassar a candidatura de um candidato de um grande partido teria grande repercussão nacional e um grande impacto na estabilidade política brasileira.

Mas em uma pequena cidade, um juiz movido por interesses regionais, pode cassar um candidato vitorioso por propaganda indevida na Internet, que talvez ele nem saiba que exista.

  • Capítulo I - Art. 3º

O Art. 3º exige que a campanha na Internet começa apenas em 06/07/2008, junto com a TV e Rádio. É possível garantir isso na comunicação oficial dos candidatos e partidos, como foi feito nas últimas eleições.

Não há como regular a livre manifestação de pensamento dos internautas. É o mesmo que dizer que às pessoas que não podem falar de política em um restaurante às vésperas do pleito ou durante a contagem dos votos. A Internet é uma rede de contatos sociais e é desejável, para o bem da democracia no país, que elas discutam o processo eleitoral, a qualquer tempo.

Na Internet são produzidas bilhões de mensagens digitais durante a campanha. É impossível para os órgãos de fiscalização ter acesso a todas e ter certeza de qual data elas foram publicadas.

  • Capítulo I, Art. 3, § 1o

Proíbe o uso de Internet na campanha de pré-candidatos, dentro de um partido. Mas qual a razão pela qual um candidato não poderá usar a rede mundial de computadores para travar um debate democrático entre seus correligionários?

Se o espaço público virtual é a extensão do espaço público real, e os filiados a um partido têm interesse pelo tema, qual o problema de usarem a Internet para troca de informações? É o mesmo que proibir o telefone para discutir as prévias.

  • Capítulo I, Art. 3, § 4o

Prevê multas para o responsável pela divulgação da propaganda e seu beneficiário.

    • E se o candidato for vítima de propaganda de um opositor, com o objetivo de prejudicá-lo?
    • E como descobrir quem publicou a propaganda, se esta for colocada em um servidor de Internet fora do Brasil, inclusive em países em que a nação brasileira não tem relacionamento diplomático? Mesmo nessa situação o beneficiário será multado?

  • Capítulo I, Art. 4

Exige a retirada de qualquer propaganda política na Internet 48 horas antes e 24 horas depois da eleição. Isso é possível quando se trata da comunicação oficial dos partidos.

Para as mensagens de uma forma geral é completamente impossível. Os conteúdos na Internet se replicam. As pessoas enviam hyperlinks uns para os outros, há caches de servidores, robôs que copiam conteúdo e replicam, ferramentas inteligentes que selecionam palavras-chaves e enviam para interessados. Não há como apagar conteúdo divulgado em bilhões de páginas.

  • Capítulo I, Art. 4

  • CAPÍTULO IV - DA PROPAGANDA ELEITORAL NA INTERNET

Art. 18. A propaganda eleitoral na Internet somente será permitida na página do candidato destinada exclusivamente à campanha eleitoral.

    • O artigo 18 proibe a inovação, o uso de ferramentas tecnológicas como os blogs, as redes de relacionamento (orkut, por exemplo), as ferramentas colaborativas Wiki, bate-papos via chat, mensagens via correio eletrônico, listas de discussão de e-mail (criada por grupos de interessados), mensagens via SMS de celular, boletins eletrônicos e outras ferramentas.
    • Condena o Brasil a voltar ao ano de 1995, em que a Internet comercial entrou efetivamente no Brasil, e as páginas de Internet eram uma das poucas formas de comunicação na rede.
    • Impede o debate democrático via Internet, que deve ser entendida como uma extensão do espaço público, espelhado no mundo virtual, e não um mero meio de comunicação de transmissão de informações de modo unidirecional.


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