quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

O que aconteceu com Bono?

Bono Vox, o nome foi "emprestado" de uma marca de aparelhos auditivos, provavelmente para sempre. Vocalista do U2, começou a carreira com músicas como Sunday Bloody Sunday, referenciando o "Domingo Sangrento" em que soldados ingleses atiraram abertamente contra uma caminhada pacífica a favor de direitos civis na Irlanda e Pride (In the Name of Love), homenagem a Martin Luther King, ativista político pelos direitos civis perante a segregação racial nos EUA. Também é conhecido por ativismo internacional pela anistia internacional, contra a fome no mundo, levantamento de fundos contra AIDS, tuberculose e malária, ajuda à Africa.

Resumindo, é uma pessoa que durante a vida, diante de um enorme sucesso como cantor, trabalhou constantemente pelos direitos civis internacionais, sucesso alcançado através da predileção de uma Indústria Musical por sua pessoa, aparência ou apelo público.

Esta Indústria Musical hoje está em evidência por suas práticas em relação ao compartilhamento na Internet, supostamente realizado por seu próprio público. Por causa disso, ela persegue seu público na internet, removendo demonstrações de adoração e propaganda.

A música como produto, numa Indústria Musical de massa, tem certas características necessárias para seu sucesso: é importante que novos produtos sejam lançados e velhos produtos descartados, que haja uma escassez de produtos diferentes, que haja uma divisão do mercado de acordo com diversos critérios, que produtos concorrentes sejam eliminados. Esta indústria vende a música como um produto tangível, cujo uso por uma pessoa restringe o uso por outra pessoa.

Esta indústria esteve sempre controlando restrições, já que seu produto não é tangível. Seu produto tem restrições ao uso em ambientes públicos, de empréstimos, de cópias, de transmissões por rádio ou TV entre outras.

Esta indústria controla quais produtos vão ser lançados, onde vão ser lançados e a que preço. Um produto que não passe em qualquer dos parâmetros da indústria são sumariamente descartados, e isso cria uma relação de poder desproporcional entre esta indústria e os produtores de seus produtos. Mercados mais ricos geralmente recebem seus produtos a um preço maior que mercados menos ricos, e isso pode parecer justo, mas é um dos principais fatores que mantém os mercados menos ricos menos ricos.

Esta indústria tem perseguido as formas de propagação de produções independentes, que são seus principais concorrentes. O aumento da oferta proporcionada pela concorrência reduz suas possibilidades de controle sobre o mercado, e proporcionalmente seu lucro. Portanto, mesmo abrindo mão de formas de propagação que poderiam ser exploradas, esta indústria solicita a restrição destas e indenização por suas perdas.

Esta indústria tem perseguido propagadores e consumidores de seus produtos, através de processos jurídicos extorsivos por valores e penas desproporcionais ao dano, apesar de juridicamente permitidos. Vem também inserindo novas possibilidades de controle ao seus produtos, como obsolescência, revogação e restrições por dispositivo. Isso faz com que o mesmo produto seja adquirido diversas vezes para dispositivos diferentes, de acordo com a disponibilidade.

Esta indústria vem tentando determinar prazos de validade a seus produtos não tangíveis. O controle por região, o combate a formas de propagação e novos dispositivos de controle dificulta a propagação de seus próprios produtos, principalmente dos que ela não tem mais interesse em comercializar, concorrentes aos seus produtos atuais.

E eis que Bono recentemente se coloca contra a distribuição de música na internet (http://www.nytimes.com/2010/01/03/opinion/03bono.html?pagewanted=1).

Sua visão de que os criadores são os mais prejudicados é no mínimo seletiva, pois não existe nada que indique que estes tenham sido sequer contemplados significativamente por esta Indústria Musical. Em seguida apela veladamente por verbas indenizatórias dos grandes provedores de internet e abertamente à Indústria Cinematográfica para ajudar na campanha de rastreamento de conteúdo pela internet. Esquece de dizer o que fazer depois disto. Atualmente, a Indústria Musical tem praticado uma espécie de extorsão.

A meu ver, Bono erra completamente em suas colocações. Me parece óbvio que a Indústria Musical atual é que precisa ser reinventada, largando as práticas monopolistas contra os produtores independentes (incidentemente o lugar mais provável de se encontrar o próximo Cole Porter) e a perseguição a seus principais divulgadores e consumidores. Se hoje esta indústria sente que falhou, é por estar mal adaptada, provavelmente de propósito, a uma economia em que os consumidores tem o direito de exigir o que eles querem consumir, a um preço acessível, sem restrições que os prejudiquem, e sem os limites artificiais que possibilitam a citada maximização dos lucros pela escassez.

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